Alguns de seus amigos chamavam de karma.
Já outros sempre a acharam de idiota. Particularmente, idiota era seu nome
do meio. O fato de estar sempre sozinha não significava que estava
infeliz. Ainda conseguia andar pelas ruas e ver beleza nas coisas que
todo mundo já esquecera.
Manteve um sorriso no rosto enquanto desabava
por dentro, durante muito tempo e ninguém se importou. Então, porque se
importar agora? Continuou sua caminhada diária pelas ruas de sua cidade,
uma cidade que não tinha muito a lhe oferecer. Meu deus, pensou, é tudo
tão difícil. Tudo bem que não precisava ser fácil demais, porém não
precisava ser desse jeito.
Ainda podia se lembrar das últimas vezes. De
como fora tachada de bobalhona, de coitadinha. Ficou sempre
para trás em tudo. Todo mundo achava que sabia o que era melhor para
ela. Mas não sabiam, dizia em voz alta no banheiro todas as noites.Sentia como se todos estivessem em cima
dela gritando e gritando para ela fazer aquilo, você já está velha
diziam, não pode se dar ao luxo de escolher. De esperar. De esperá-lo. Escutou uma vez: "Q
Por que não podiam dividir o mesmo chão se estão sob o mesmo céu
estrelado? Doía tanto nela que o que desejava seriam só palavras. Não,
na verdade não doía. Não era dor. Estava anestesiada pela morfina e tudo
o que sentia era o vazio dele que já estivera aqui. Ela estava tão
presa nas palavras que cada uma delas era ele lhe sorrindo. Cada letra, cada dedo sujo de tinta de caneta, cada olhar, cada borboleta no
estômago era ele vivo dentro dela.
O vazio vinha quando ela lembrava deles juntos. Talvez
fosse um amor tão grande, tão grande, mas tão grande que não cabia só
dentro deles. Mal cabia no mundo.
Quem sabe numa outra vida, numa outra época. Apegava-se à crença de que
algum dia ele seria seu. Só seu, em algum lugar perdido desse mundo.
Era bonito pensar em estar junto com ele.
Leu uma vez que a melhor forma
de esquecer um amor é transformá-lo em literatura. Ela já havia começado a fazer isso mas, ele era mais; era
tudo o que suas paredes, sua boca não mais tocada pela dele ainda
conseguia ser. Era o único jeito que encontrou de mantê-lo consigo:
dentro das palavras, que um dia ele conseguiria enxergar com todo o
amor do mundo. E hoje pensei em ti... chorei... e sorri.
Era uma vez uma pessoa que lhe deu carinho e amor, que lhe
acolheu nos momentos de aflição e lhe ensinou a manter calma e paciência,
mesmo sendo muito ansiosa.
Era uma vez uma pessoa que se manteve sempre ao seu lado. Era uma vez uma pessoa que tinha suas falhas, mas tinha qualidades belíssimas.
Era
uma vez uma pessoa que lhe ensinou a ver as coisas e as pessoas com
outro ponto de vista, sem julgamentos. Era uma vez uma pessoa que lhe cantou milhares de músicas. Era uma vez uma pessoa.
Era uma vez: eles.
Eram uma vez: ela.
Era um vez: ele.
Era uma vez ...